quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

A EJA E OS DESAFIOS

Apontando a EJA como uma modalidade que ainda necessita de mais efetividade nas ações, os autores Paulo de Camargo e João Bittar, apresentam uma interessante reportagem sobre o perfil dos alunos e algumas das reais necessidades destes sujeitos/cidadãos.

acompanhem a reportagem e deixem seus comentários

Boa Leitura!!!
Editor BEJAB


"Desafio à espera de soluções


Programas voltados à Educação de Jovens e Adultos carecem de maior articulação entre si para que sejam mais efetivos

Paulo de Camargo e João Bittar

       Cerca de 8,6 milhões de brasileiros que estão entre os 18 e os 40 anos, o auge da vida profissional, t~em apenas até três anos de escolaridade
       Com as atenções voltadas para a questão da qualidade, tema que tem dominado vários dos debates públicos sobre educação no Brasil, tem passado quase despercebida uma outra questão: a do acesso de jovens e adultos analfabetos ou pouco escolarizados. Vivem hoje no Brasil pelo menos 39 milhões de habitantes de 15 a 40 anos, que acumulam déficits que vão do analfabetismo pleno ao ensino médio incompleto. Esses números não estão ocultos. Basta uma leitura dos dados da Pnad 2007, como a que faz regularmente o sociólogo Simon Schwartzman, diretor do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade, no Rio de Janeiro. Há poucos meses, Schwartzman apresentou um pequeno estudo denominado "Educação para os que ficaram para trás", no qual alertava para o buraco negro nas políticas públicas de educação, em todos os âmbitos.
       "O problema das pessoas sem escolaridade é conhecido, mas não existem políticas adequadas para lidar com ele", diz. Os dados são impressionantes, principalmente quando se tem em perspectiva a ambição do Brasil em integrar o mundo desenvolvido. Segundo os números reunidos pelo sociólogo, apenas entre homens e mulheres com idade entre 18 e 40 anos, ou seja, no auge de sua vida profissional, há 8,6 milhões de brasileiros com menos de três anos de estudo.
       Contudo, o mundo marcado pela revolução tecnológica exige bem mais do que a escolaridade correspondente ao ensino fundamental I. A própria Constituição Brasileira estabelece como escolaridade mínima a Educação Básica, que compreende o ensino médio. Aí, os números são eloquentes: há 21 milhões de cidadãos com idade entre 18 e 40 anos sem o diploma - sem habilitação para seguir o ensino superior ou mesmo cursar o ensino técnico de nível médio. "Nossa estimativa é que haveria 40 milhões de pessoas até 40 anos que poderiam se beneficiar de programas competentes de educação e qualificação para o mercado de trabalho", projeta o Iets.
      Para os especialistas, o dramático dessa situação é que ela não se resume ao oferecimento de cursos supletivos. Trata-se de um cenário muito mais complexo do ponto de vista humano, cujosingredientes são adultos com idades, condições sociais e projetos de vida muito diferentes. As demandas educacionais são diversas, e fragmentamse em áreas que vão da alfabetização à habilitação profissional técnica. "É preciso destacar que nem todo mundo que não fez escolarização básica ou fundamental quer estudar. E talvez até queira, mas não demanda, não tem horários, condições, trabalha o dia inteiro, é idoso", lembra o economista Sérgio Haddad, coordenador da ONG Ação Educativa, que foi um dos idealizadores do primeiro Fórum Internacional da Sociedade Civil (Fisc). O Fórum aconteceu em novembro, em Belém (PA), paralelamente à 6ª Conferência Internacional de Educação de Adultos.
     Citando dados de um estudo recente do IBGE, Haddad lembra que apenas 2,9% dos jovens analfabetos entre 15 e 24 anos frequentavam algum curso de alfabetização. Entre os adultos acima de 24 anos, apenas 1,8%. "De cada 100 pessoas que saem dos programas de alfabetização apenas seis ingressam nos programas de Educação de Jovens e Adultos", lembra. A evasão é enorme, e chega a quase metade dos ingressantes. Mesmo os dados do total de brasileiros que participam de programas de EJA são divergentes, segundo Schwartzman. O MEC contabiliza cerca de 5 milhões de alunos, enquanto o IBGE identifica perto de 3 milhões de matriculados. Na maior parte, são pessoas que querem completar sua escolaridade no ensino fundamental II (6º ao 9º ano) ou médio.
       Além da oferta insuficiente, as principais críticas aos programas existentes é que não dialogam entre si, ou seja, não há continuidade entre suas diferentes fases. Ainda dependem de políticas localizadas e ações isoladas, diz Haddad, exemplificando com os programas de alfabetização. Nesse campo, existem apenas programas curtos, com monitores não especializados e com caráter de voluntariado. "Ainda mais parecem campanhas, com caráter salvacionista", critica.
      Os programas são fragmentados, lembra Schwartzman. A questão, na história recente do Brasil, foi marcada por iniciativas isoladas, como as ligadas ao Ministério do Trabalho e outras áreas do governo, ou pela ênfase em programas de alfabetização, como no governo de Fernando Henrique ou na gestão de Cristovam Buarque, no primeiro governo Lula. Para Haddad, embora o governo atual tenha assumido a responsabilidade de oferta de programas na área, centralizando na Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, ainda não se agregou qualidade ao sistema. O problema se agrava quando se consideram as políticas estaduais e municipais, tímidas e sem parâmetros de avaliação.
       No âmbito das iniciativas do governo federal, um dos principais programas, o Pro-Jovem Urbano, tenta reverter problemas históricos, segundo a sua coordenadora, Maria José Feres. Para driblar a resistência dos estados, o programa faz uma linha direta com municípios com mais de 200 mil habitantes. No final do ano passado, participavam 85 cidades, de 22 estados brasileiros, atendendo a pouco mais de 300 mil jovens. Destinado a alunos alfabetizados que não completaram o ensino fundamental e o médio, o Pro-Jovem Urbano oferece, para cada aluno, uma bolsa de R$ 100, com a exigência de frequência mínima de 75% das aulas e igual índice de aproveitamento nos trabalhos solicitados. Os docentes são contratados especialmente para o curso, e trabalham com materiais didáticos desenvolvidos para esse perfil de estudante.

        Falta de diálogo
        Distribuído em 18 meses, o Pro-Jovem acontece obrigatoriamente em um ambiente escolar, oferecido pelas prefeituras - justamente para evitar situações correntes, como aulas em galpões e espaços improvisados. O compromisso das administrações municipais ai além: precisam garantir aos alunos acesso a laboratório de informática e programas posteriores de qualificação profissional. O objetivo é passar de 500 mil alunos, ainda em 2010. Segundo Maria José Feres, tudo é avaliado por universidades federais - atendendo a outra crítica constante aos programas, cuja qualidade é raramente aferida. "Todos os resultados mostram que o caminho é correto", diz.
       Embora seja um orgulho da administração federal, o Pro-Jovem padece, segundo Haddad, de um mal de origem. "Sua virtude é ter foco, mas atende um público relativamente pequeno, está isolado de uma política educacional nacional e não dialoga com outros programas. Assim, corre o risco de se tornar um apêndice de outras políticas", argumenta.
        Para o especialista, qualquer programa de EJA precisa necessariamente estar acoplado a possibilidades de mobilidade social - e isso não se resume à preparação técnica para o trabalho. A educação nessa área também precisa oferecer uma formação mais ampla para o exercício da cidadania. É por isso que dos poucos que foram atendidos até 2007, 42,7% largaram os estudos. E estudo do IBGE mostra que apenas um quinto dos entrevistados dizem estudar para conseguir melhores oportunidades de trabalho. "Essas respostas apontam para um interesse maior dos alunos para sua formação geral do que um olhar instrumental para a escola como acesso para melhores empregos."
        Atrair, integrar, evitar o abandono, formar, oferecer uma perspectiva de futuro - o desafio da Educação de Jovens e Adultos talvez seja um dos mais complexos para a sociedade brasileira nos próximos 20 anos. Até porque, com a melhora da abrangência do atendimento e do fluxo escolar, a taxa da escolarização das populações mais jovens aumenta sensivelmente. Mas não é possível fechar os olhos para tamanho passivo social. E nesse campo, demos apenas os primeiros passos."


Para obter maiories informações sobre o PRO JOVEM: http://www.projovemurbano.gov.br/
Reportagem extraída so site: http://revistaescolapublica.uol.com.br/materia.asp?edicao=14&id_materia=114